Preciso homenagear a escrita de José Castello. Sou habitué
de sua coluna no “Prosa”, aos sábados, mas a de hoje me deixou veramente emocionada.
E isso é o que a boa arte faz, sensibiliza e devolve as gotas de humanidade que
vamos perdendo na estrada ‘descastelada’.
Não teria condições de ler tudo que o Castello comenta - às
vezes até ele parece que nem gosta muito do que leu, porém sua elegância ao
transparecer isso como uma incerteza me seduz mesmo assim. Não importa, me
sinto preenchida lendo a ele, por seus olhos que sempre alargam meus horizontes.
Feita a reverência a seu gênio poético, analítico e sedutor,
passemos, pois, a coluna intitulada Auster
na estrada, que parafraseei no título deste post. Paul Auster me é
apresentado como um poeta denso, questionador da palavra, tentando compreender
como o que nos ilumina ao mesmo tempo nos deixa na escuridão.
“Quando parares nesta estrada,
a estrada, dali em diante,
desaparecerá”
O sugestivo nome ‘Braile’, título de seu livro, mostra que a
escrita nos toca, que é uma forma de expressão mais do que meramente visual.
Diz José Castello em seu segundo parágrafo:
“É uma escrita ‘material’, em que o tato (contato direto com
a matéria) substituiu a fluidez da visão como via de acesso à mente. Adverte-nos
Auster: não importa o caminho, se visão (imagem), ou tato (corpo); quando
deixamos de percorrê-lo, ele desaparece. Os poemas (e as realidades que eles descerram)
não existem fora de nós, mas dentro. A realidade não é o real – não é a matéria,
que sempre nos foge. Mas o modo (estilo) como o acessamos.”
Infelizmente O Globo não disponibilizou, ainda, essa coluna
no jornal virtual (do contrário eu colocaria o link aqui), mas recomendo
fortemente sua leitura e reflexão. Deixo com vocês mais um poema de Auster e
mais uma explicação brilhante de Castello:
“Na impossibilidade das palavras,
na palavra não dita
que asfixia
eu me encontro”
“Dizendo de outra maneira: só me encontro quando silencio. Só
quando me entrego à arbitrariedade do corpo e à moral de pedra da matéria,
enfim sou. Contudo, ainda não sou humano. É só nesse salto à frente – avanço teimoso
sobre a parte da estrada que ainda não consigo ver – que me constituo homem. Não
caminhando sobre a realidade, mas caminhamos sobre nós mesmos. Fazer poesia,
então, é alargar-se”.