sábado, 23 de março de 2013

Na estrada, com Castello



Preciso homenagear a escrita de José Castello. Sou habitué de sua coluna no “Prosa”, aos sábados, mas a de hoje me deixou veramente emocionada. E isso é o que a boa arte faz, sensibiliza e devolve as gotas de humanidade que vamos perdendo na estrada ‘descastelada’.

Não teria condições de ler tudo que o Castello comenta - às vezes até ele parece que nem gosta muito do que leu, porém sua elegância ao transparecer isso como uma incerteza me seduz mesmo assim. Não importa, me sinto preenchida lendo a ele, por seus olhos que sempre alargam meus horizontes.

Feita a reverência a seu gênio poético, analítico e sedutor, passemos, pois, a coluna intitulada Auster na estrada, que parafraseei no título deste post. Paul Auster me é apresentado como um poeta denso, questionador da palavra, tentando compreender como o que nos ilumina ao mesmo tempo nos deixa na escuridão.

“Quando parares nesta estrada,
a estrada, dali em diante,
desaparecerá”


O sugestivo nome ‘Braile’, título de seu livro, mostra que a escrita nos toca, que é uma forma de expressão mais do que meramente visual. Diz José Castello em seu segundo parágrafo:

“É uma escrita ‘material’, em que o tato (contato direto com a matéria) substituiu a fluidez da visão como via de acesso à mente. Adverte-nos Auster: não importa o caminho, se visão (imagem), ou tato (corpo); quando deixamos de percorrê-lo, ele desaparece. Os poemas (e as realidades que eles descerram) não existem fora de nós, mas dentro. A realidade não é o real – não é a matéria, que sempre nos foge. Mas o modo (estilo) como o acessamos.”

Infelizmente O Globo não disponibilizou, ainda, essa coluna no jornal virtual (do contrário eu colocaria o link aqui), mas recomendo fortemente sua leitura e reflexão. Deixo com vocês mais um poema de Auster e mais uma explicação brilhante de Castello:

“Na impossibilidade das palavras,
na palavra não dita
que asfixia
eu me encontro”

“Dizendo de outra maneira: só me encontro quando silencio. Só quando me entrego à arbitrariedade do corpo e à moral de pedra da matéria, enfim sou. Contudo, ainda não sou humano. É só nesse salto à frente – avanço teimoso sobre a parte da estrada que ainda não consigo ver – que me constituo homem. Não caminhando sobre a realidade, mas caminhamos sobre nós mesmos. Fazer poesia, então, é alargar-se”.



6 comentários:

  1. Fantástico Rita! Quanta ressonância da sensibilidade dele, da sua, do autor citado por esta potência das palavras que nos desnudam, nos curam, nos fazem atravessar tantas vezes o caos. Como é bom aprender a ver e reconhecer o que é essencial e pela vida.

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    1. Obrigada, Cris. Pois é, devemos estar sempre abertos para aprender e sensíveis para nos deixar tocar pelo que importa, a humanidade que ainda nos resta.

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  2. Fantástico Rita! A forma como voce descreve e passa sua sensibilidade,sua emoção e suas palavras .
    Lindo poema do autor me emocionou.
    Realmente uma excelente reflexão buscando o que é essencial para Vida. Beijos - Luciene Magnago

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    1. Que bom, Lu. Fico feliz que o poema do autor também tenha te emocionado. Ah se todos pudessem se emocionar mais...

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  3. Rita , também li o Castelo.Muito bom.Vc , como amante da poesia, não poderia deixar de amar e sentir o que nos passa Paul Aster , via Castelo. Sentir e desejar ler o poeta... Você encontrou as ressonâncias.
    Parabéns!
    Elô

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    1. Que beleza, Elô, ver tantos antenados e sensibilizados. É um alento neste mundo, uma esperança.

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