Hoje é Dia de Finados, mas não vou falar dos nossos entes queridos que moram agora em outro andar. Queria comentar uma crônica, disfarçada de matéria, que por acaso li hoje no Globo, no caderno Carro etc. Nunca leio esse caderno, mas a foto do carro da funerária e o título e subtítulo me chamaram a atenção.
A morte pede carona
Ganhar a vida ao volante de um carro fúnebre é de matar. Sentimos isso na pele...
O repórter Marco Antonio Rocha conta com graça do horror das pessoas que querem distância do inusitado veículo. Ninguém quer manobrar, lavar o carro, nem ao menos distribuir panfleto no sinal fechado ou ‘limpar’ o pára-brisas.
A maioria das pessoas deseja tanta distância da morte que alguns nem perto de cemitério passam, outros se benzem sempre, porque como diz aquele anúncio de seguros, “Vai que...”
Morte, morte, cada vez que parte um de nós lembramo-nos da nossa efemeridade e desta agenda aberta que não marca dia nem hora. Assusta-nos a perspectiva de não viver mais, porém devia amedrontrar-nos ainda mais a possibilidade de viver sem aproveitar, sem amar, sem entrega, sem felicidade. Ainda não sei se a morte é sem, mas a vida, esta é com, com certeza.
Sei não, acho que o jornalismo começa a enveredar pelo contismo, o que não é mal, alguns jornalistas escrevem mesmo direitinho e levam jeito novelesco, digamos assim. E se contarmos com as péssimas notícias que lemos na imprensa, um pouco de alma, desde que não seja penada, não faria mal. Salvem as almas literárias!
P.S: A foto é de um carro funerário sem ares fúnebres, mas acho que não emplaca por aqui não.
Gostei da ideia de carros funerários diferentes, nada de preto, nada desse luto cerimonioso, desse pretenso "respeito" pela morte. Com certeza não é um respeito pelo morto, como se finge pretender, posto que o morto deveria ter sua existência celebrada - e não ter como invólucro do corpo essa cor a anunciar o fim, o emudecimento, a ausência de luz e de tudo. Esses rituais foram-nos inculcados a fim de semear nos que ficam o MEDO. Quem tem medo torna-se facilmente manipulado. Sem dúvida a morte de um ente querido é uma tristeza, de um parente, de um amigo, ou mesmo de desconhecidos a quem tínhamos alguma simpatia ou que achamos que morreram injustamente, absurdamente. Tristeza sim, medo não. Acho que os rituais de passagem devem estar contagiados pela vida, cheios de vida. Seja a vida que virá (como nas formaturas, casamentos e outros), seja pela vida que foi, que existiu e de alguma forma nos enriqueceu, nos alegrou (como nos funerais).
ResponderExcluirQuero meu carro funerário pintado de sol, no seu azul, sobre montanhas verdejantes.
E completando essa sua ideia, digamos, 'desrespeitosa', no México eles comemoram a morte com alegria, muita fartura gastronômica, música, dança. Lá acredita-se que os mortos serão felizes para sempre. Será que a civilização pré-colombiana ainda tem muito a ensinar-nos?
ResponderExcluirRita e Newton, esse é um assunto danado de complexo. Não sei ainda o que pensar sobre o fim. Aos poucos, nos últimos anos, fui perdendo minhas referências religiosas e não encontrei nada para preencher o vazio que fica quando nos despimos de antigas convicções. Não sou nem ateu nem agnóstico; e ,no entanto, também não sou religioso; não mais. Porém, ainda conservo alguma metafísica, e quem sabe essa metafísica não faça encontrar o meu ponto de apoio no "Mistério Absoluto do Universo", um outro nome para Deus na concepção de Einstein. E então, quando o ocaso da vida se apoximar para mim, eu possa dizer como o velho profeta: "contemplo os dias passados, mas tenho os olhos voltados para a eternidade"; seria um jeito bom de lidar com o mistério do fim, e quem sabe construir outro mistério, o mistério do Sem-Fim.
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