sábado, 1 de março de 2014

Carnaval, poesia dos pés à cabeça

Manhã de carnaval
meu samba quer espreguiçar
e ao ritmo de tantas páginas
sair com loucas fantasias



Foto do Blog do Alienista


Vem, vamos dançar
marchinhas sem pé
representar nessa alegoria
a alegria perdida dos dias
sem festa

Toma meu enredo
faz-me rir dessa desdita
faz-me rir de mim
que é por isso que vale a pena
a vida.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Homofobia deve ser crime em qualquer país. Alô África!

Estarrecedor, absurdo, criminoso. São adjetivos que me vêm à mente quando leio o tratamento que está sendo dado a homossexuais na África. E, como vivemos em plena era da globalização, onde a distância está a um clique de nós, esse retrocesso indesculpável importa e muito.

Excetuando a África do Sul, único país do continente onde os relacionamentos homo são legalizados, e alguns poucos países sem legislação específica, todo o restante da África é não apenas homofóbico como ainda sujeita quem assume sua preferência sexual a sanções e até à pena de morte. Isto em pleno século XXI.


Se no passado a religião era usada como desculpa para apoiar o repúdio às uniões homo, hoje, além do uso religioso continuar justificando inúmeras formas de tirania e opressão, é o governo quem aparece como vilão, legitimando o barbarismo. Incutir medo e cercear a liberdade, em suas várias formas, sem dúvida facilitam a manipulação de uma sociedade e a perpetuação dos interesses de seus governantes. Mas, ainda assim, não consigo entender essa ira, esse preconceito nojento por uma decisão que é individual. Como podem as pessoas se sentirem ofendidas se a opção sexual de A ou B é diferente da sua? Isso não é cultural, antropologicamente falando, e nem animal pois que os tachados de irracionais não apresentam esse comportamento hediondo. Sei lá o que é, mas é preciso o nosso repúdio mais vigoroso e veemente.


O quadro na África, segundo o Jornal O Globo de 16/02/2014

Atos homossexuais proibidos em: Marrocos, Argélia, Líbia, Tunísia, Egito, Guiné, Senegal, Angola, Namíbia, Botsuana, Zimbábue, Moçambique, Malauí, Tanzânia, Burundi, Quênia, Etiópia e Sudão do Sul.

Além de proibidos, punidos com pena de morte em: Mauritânia, parte da Nigéria, Sudão e Somália.

Em andamento leis que criminalizam atos homossexuais: Rep. Centro-Africana e Uganda.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Ninfomaníaca: uma mulher insaciável?

Gosto de polêmicas. Acho que tendemos a aprender e a engrandecer com o controverso. Também sou curiosa e ultimamente tenho revisitado minhas posições a respeito do sexo. Então fui assistir à “Ninfomaníaca”, que conseguiu a proeza de bonequinhos aplaudindo, olhando e indo embora. Devo dizer que amei, um filmaço. Com certeza verei o volume II e guardarei o nome de Lars von Trier ao lado de Almodovar, Quentin Tarantino, Woody Allen e outros que adoro.

Para não ser ‘spoiler’, pouparei vocês de uma sinopse, mas gostaria de ponderar alguns aspectos:

- se há cenas de sexo explícito? Com certeza, mas isso aí você faz, já fez ou sabe muito bem o que é, então por que se chocar?

- tente ver pelos olhos da protagonista. Enxergue além do óbvio que sempre querem esfregar na nossa cara que é para não vermos mais nada. Refute esta mesmice, afaste-se e aí entre no intrincado novelo emocional da ninfo.

- permita-se questionar-se a respeito da virgindade, da prática sexual com vários parceiros, dos significados ocultos entre o prazer e a dor.


Deixe o preconceito na porta do cinema e divirta-se!


quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Conto classificado na Antologia UFF 2013: Meu encontro

Amigos, compartilho com vocês a alegria que tive ontem, 17/12/2013, durante a cerimônia de premiação e lançamento da Antologia do Prêmio UFF de Literatura 2013, cujo tema, em homenagem a Vinicius de Moraes, foi "A vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida".


 O evento aconteceu no auditório da Academia Fluminense de Letras, na Biblioteca Nacional de Niterói. Abaixo vocês podem ver a foto do grupão que integra a Antologia e a foto dos seis membros do Clube de Leitura Icaraí, do qual participo com muito orgulho, todos classificados.


A partir da esquerda: Luiz, Newton, Winter, Rita, Benites e Benito


E agora, deixo com vocês o meu conto. Quem desejar ler os demais textos premiados pode acessar o blog do Clube de Leitura.

http://clubedeleituraicarai.blogspot.com.br/

Abraços,

Rita

MEU ENCONTRO




Éramos dez. Achei que seríamos um grupo ainda menor. Confesso que, antes de entrar, pensei várias e várias vezes, perdi o sono, tive muita vergonha, mas enfim, resolvi tirar minhas lentes de contato - não tanto porque não posso enxergar bem os demais, mas porque não posso ter certeza da fisionomia deles quando me vêem. E assim consegui a coragem para comparecer, um pouco menos desconfortável, só um pouco.
Na recepção nos indicaram o local do vestuário. Cada um que entrava se dirigia para lá, onde, no nosso armário, um roupão atoalhado cor bege esperava, dobradinho. Sentamos em círculo com uma cadeira no meio, a do mediador. Quando a moça da recepção avisou que todos os participantes estavam presentes, o mediador levantou-se, trancou a porta, dirigiu-se para a lateral da sua cadeira, tirou o roupão e ficou em pé no meio de nós, inteiramente como veio ao mundo, para explicar o método, melhor dizendo, a experiência.


  Não sei se alguém prestou atenção, eu não consegui. Mesmo sem a minha lente eu ia vendo uma coisa balançando à medida que ele falava e me desconcentrei. Comecei a suar, senti o rosto quente, acho que viajei.
D. Lorena, d. Lorena, a senhora entendeu? Agora todos precisam tirar o roupão. Podem ficar com ele sobre a cadeira mesmo e sentar em cima. É até bom que protege.
Siim, eu disse meio gaguejando e com a voz rouca – sempre que fico nervosa minha voz começa a sumir. Esse homem é um louco, pensei. Protege? Protege? Que é isso? Nunca me senti tão desprotegida. Olhei ao redor e todos já tinham se livrado de suas vestimentas. Quatro homens e seis mulheres. Meu Deus, como é que eu vim parar aqui? Desembaracei-me daquele cordão na altura da cintura desfazendo o meio nó, movi os braços para tirar as mangas sem me levantar, o roupão ficou preso, tive que levantar um pouquinho, que constrangimento! Olhei para baixo, ai que vergonha! Ainda por cima fiquei toda arrepiada - era de frio, mas vai que alguém pensasse diferente... minha nossa senhora, valei-me.
***
O mediador - eu não gravei o nome dele ainda -, sentou-se e pediu que nos apresentássemos e contássemos nossa experiência prévia em tratamentos anteriores. Pediu que o senhor careca começasse.
Essa deve ser minha décima tentativa. Já tentei nutricionista, endocrinologista, ortomolecular, mas o problema sempre volta. Emagrecer eu emagreço, mas não consigo manter. Depois de dois meses começo a engordar tudo de novo e mais ainda.
A seguir veio a moça que estava ao meu lado – eu seria a próxima e já comecei a gelar -, ela disse que tinha ido a médicos, usado produtos naturais, tomado vários tipos de chás e também engordava tudo de novo pouco tempo depois.
        Eu? Bem, como os colegas, fiz inúmeras tentativas. Além de médicos, tentei a dieta Dukan, a mediterrrânea, a de 600 calorias, fiz caminhadas e ginástica. Tive bom resultado em algumas vezes, mas com o tempo...
A dança das cadeiras continuou. Havia entre nós até um senhor que já tinha feito cirurgia bariátrica, aquela que reduz estômago, sabe? e mesmo assim engordou de novo, porque tinha compulsão por leite condensado e bebia direto da latinha toda vez que sentia fome.
Na segunda rodada de perguntas tipo ‘integração’, como chamou Danilo - acho que esse é o nome dele, me recordo agora -, a questão foi porque resolvemos aderir à experiência. 
Na vez da minha resposta, o grupo riu pela primeira vez - precisávamos mesmo de um pouco de descontração, ufa! -, e eu só respondi a verdade: desespero.      
Após a saraivada de comentários que no fundo diziam mais ou menos isso, Danilo começou a falar. Levantou-se de novo, foi até o ‘flip chart’ e desenhou um rosto desconjuntado de um corpo. O rosto era redondo e o corpo, obeso, disforme e assexuado.
Esse, senhores, fui eu, ele disse. Esse, senhores, são vocês hoje. Alguém discorda?
Ninguém falou coisa alguma. Danilo então nos contou de sua formação em psiquiatria e psicologia e que é sabido em todo o meio médico que em um grande número das pessoas que engorda e tem dificuldades para controlar o peso, a causa é emocional, excetuando os problemas na tireoide e outras raras enfermidades. Mas que não convém a tantas especialidades médicas e nichos de mercado abertos com o filão da obesidade divulgar isso. Trata-se o efeito e não a causa, daí o método atual ser inovador, ele disse.
Continuou explicando que optaram por uma abordagem não ortodoxa, “não vamos indicar sessões de psicologia para ninguém” por acreditarem que o resultado seria muito mais rápido. Eu deixei a reunião com dor de cabeça, nunca pensei que vergonha desse enxaqueca, mas enfim, ao menos permanecia viva.
***
  Em casa me esmerei ao máximo na ingestão de poucas calorias, comprei peixes, fiz legumes ao vapor, caminhei a semana quase toda, fugi dos doces como o diabo da cruz. No encontro nudista da semana seguinte, digo, no encontro para emagrecer, eu tinha perdido dois quilos. Quase todos os companheiros de opróbrio também foram vitoriosos e aos poucos íamos deixando, junto com os quilos a mais, a timidez.
Falávamos de nossos sentimentos durante a semana, do que nos motivava a continuar prestando atenção à alimentação, aos exercícios. Vomitávamos sapos, derramávamos hipócritos conceitos, chutávamos o balde mesmo, como se diz. O olhar do outro ali sempre tinha um grande peso, mas esse era incrivelmente leve e só nos ajudava nas balanças, tanto na física quanto na emocional.
De minha parte, o que eu queria era parecer melhor e mais agradável aos colegas e a mim mesma. Mudava por dentro para transparecer por fora. Em casa sentiam a diferença. Minha forma de tratar a família era outra, o tom crítico dava lugar a uma abordagem mais compreensiva. A assertividade das colocações aumentava no trabalho também e a descontração com os amigos era evidente. Mudei as cores das minhas roupas, meu estilo, cortei o cabelo, caprichei nas unhas. Queria refletir o novo eu que estava reconstruindo.
Ao cabo de três meses de programa nosso incentivador mor, no início do encontro, fez outro desenho no quadro. Era um rosto com um corpo; não tinha nada de atlético, mas era uno. Muitos sorrisos iluminaram aquela reunião. Sabíamos que, na realidade, o tratamento ia muito além do corpo, o foco era a auto-estima, mas, que importa? Ela estava lá no alto mesmo.
***
Fiquei no programa durante uns sete ou oito meses. Saí de lá com o que a ciência diz ser a faixa recomendável para minha idade, altura e sexo, mas isso nem de longe foi o principal. Eu agora me gostava, estava feliz e confiante. Não que eu ache que os obesos tenham problemas com a felicidade, cada um com seu cada um, com seus parâmetros e seus conceitos, mas, admito, eu tinha. Aliás, eu e todos os que estavam naquele grupo. Isso descobrimos depois, quer dizer, nosso mediador nos contou que o critério usado para selecionar o grupo-teste incluía os que já tinham feito várias tentativas de emagrecer sem sucesso e se sentiam mal com isso. Eu superei o medo de me encarar desnuda e sei onde estão cada uma das minhas muitas máscaras. Só que eu, eu não preciso mais delas.
Três anos já se passaram. Sim, se você quer saber, continuo magra. Fome? Normal, quer dizer, até hoje de manhã, quando li no jornal a seguinte manchete, título e subtítulo: Charlatão vende filmes com obesos nus. Falso psicólogo prometia método inovador de emagrecimento. E na matéria, minha foto, eu ali, nuzinha em pelo, só com um quadradinho disfarçando meu rosto.  Alguém me compre um chocolate, URGENTE!




segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Sexualidade teen: como encarar?

Este texto é um perigo, um perigo para mim mesma que tenho que me defrontar com os novos conceitos sobre sexualidade a esta altura da vida. Ah, ser mãe, às vezes, é mesmo padecer, só que sem paraíso.

Comecemos pelo mais ameno. Vejo, com certo estarrecimento, que a França se divide sobre um projeto de lei que quer multar clientes de prostitutas e com isso volta toda uma discussão sobre prostituição e promiscuidade. O que me chocou na notícia foi, primeiramente, o sutiã (termo jornalístico que se refere a um sobretítulo, em oposição a subtítulo e, aliás, muito próprio à natureza da matéria, rsrsrs): moralismo ou drama sanitário?

Nossa, acho incrível que no século XXI, no ocidente, especificamente no país de De Gaulle e no Brasil, ainda se usem um termo tão preconceituoso como ‘drama sanitário’ ligado ao mercado sexual. Isso continua amedrontando? Como a elites reproduzem arcaicos conceitos e lançam mão de qualquer coisa para fazer valer seus valores parentes da eugenia. Eca!

Dito isto, entremos no meandro da questão. Falar é uma coisa, fazer ...

Em conversa com meu companheiro de trocas de ideias a respeito, e pai, ele me disse que chega à nossa era o que pregavam os hippies, sexo livre, geração paz e amor (mais amor do que paz, cá pra nós) - isso por conta de um programa que eu, por acaso zapeando, vi no Discovery Home and Health. Isso é healthy? foi logo o que pensei ao ver do que se tratava.




Bem, continuemos. Na Grã-Bretanha, os adolescentes contam com um serviço gratuito para tirar dúvidas de cunho sexual ou erótico. Em resumo é isso. E acompanhei algumas dessas dúvidas. Coisas do tipo ‘como posso fazer sexo oral melhor no meu namorado’ ou ‘acho que meu pênis é pequeno e isso me inibe de procurar os rapazes’ ou ‘minha vagina é feia demais e tenho medo de transar por conta dela’, ou ainda ‘meu namorado não me procura como antes. O que posso fazer para excitá-lo’. Na equipe do programa, uma psicóloga, uma ginecologista e ‘técnicas em prazer’, na ausência de nome mais propício. Tudo falado abertamente, sem o menor constrangimento ou moralismo. Apenas, quando uma teen destas disse que fazia sexo em locais públicos, o psicólogo com o qual ela falou retrucou que é preciso se ater às leis. Porém, não sendo ilegal...

Fiquei ali, pasmada, me sentindo completamente ultrapassada e questionando meu papel de mãe de duas adolescentes nesta realidade quase mundial.

Sim, porque o exemplo que vem dos britânicos apenas comprova o que tenho observado em conversas diversas com outras mães tupis-guaranis como eu, em notícias na imprensa e na internet em geral. Muitos adolescentes, especialmente as meninas, estão com uma postura radicalmente diferente sobre o sexo. Enviam fotos suas nuas ou transando, experimentam sexo com o masculino, o feminino, o ambíguo, de tudo um pouco. Há quem chame de sexo flex. Para conhecer, para decidir, para liberar-se?

Não sei bem até onde vale a experiência e quais podem ser as consequências, mas casos de suicídio foram relatados, meninas que tiraram a vida após terem fotos íntimas reveladas no face com comentários pra lá de picantes por ex-namorados e curtidores de ocasião.

Não quero ser retrógrada, machista, preconceituosa, mas tampouco sigo como vaca de presépio modas impulsionadas pelos modernos recursos tecnológicos. Preocupa-me, sobretudo, a sanidade mental de minhas meninas, mas não sei se é isso mesmo ou se, hipocritamente, estou é usando de desculpas para manter a máxima de que a mulher deve se dar ao respeito quando o próprio conceito de respeito é tão fluido e manipulado. Não à promiscuidade, sim ao recato, isso aí me cheira à bandeira da Marcha da família em março de 64.

Quando mocinha, eu desafiava meu pai questionando conceitos sobre virgindade, liberdade. Não queria nesta fase da vida cantar como Cazuza que

“ aquele garoto que ia mudar o mundo frequenta agora as festas do "Grand Monde",

mas ideologia, eu quero uma pra viver, e alguma ajuda também. 



sábado, 30 de novembro de 2013

É inspirador ler Mia Couto, sempre

Lembro de ter lido, há alguns anos, que uma rica modelo e atriz americana disse que quando criança pensava que todos viviam em mansões. Que coisa!, pensei preconceituosamente, tinha que ser americana para viver tão fora da realidade. Hoje, feliz roda do tempo, leio que “Eu pensava que todo mundo quando ficava adulto virava automaticamente poeta”, fragmento de mais uma bela entrevista de meu querido escritor Mia Couto.

Que visão fragmentada do mundo temos quando crianças e como nossos cacos podem virar mosaicos na vida adulta, seja lá o que isso for. Continuamos com nossas visões limitadíssimas, ao que a mídia deixa e quer passar, ao que interessa ou não que pensemos que sabemos, mas essa discussão mais política e desanimadora não quero que venha atrapalhar meu momento poético de sábado.

É lindo sentir como os africanos vêem o silêncio,

“O silêncio permite que haja comunicação, não é uma ausência, não é uma pausa absoluta. Depois, tem essa outra dimensão que é social, do meu lugar. Os africanos olham o silêncio como uma coisa que não é incomodativa. Às vezes, o que eu vejo em outros lugares, quando as pessoas estão num grupo e se cria um silêncio, é que aquilo tem que se resolver, é um vazio. Ali não, o silêncio está cheio de vozes, não existe nunca. O silêncio não é aquilo que parece, não é uma ausência.



É inspirador ler Mia Couto, sempre. Vou refletir sobre o que ele pensa da busca da identidade. Veja abaixo e me diga se também te instiga.

O que se passa é o seguinte: essa busca da identidade é um grande assunto para todos nós. Não é uma coisa literária, não é um assunto filosófico. Temos sempre de explicar quem somos, e é uma miragem, é sempre uma coisa equivocada. Nunca somos uma coisa, não temos uma identidade, temos várias, e elas vão mudando com o tempo, vão mudando com a idade, vão mudando com a relação que a gente tem. Eu vejo que isso foi uma coisa que no início surgiu dramática em mim próprio. Tenho que saber quem sou, e eu era um cruzamento de tanta coisa, era um ser de fronteira, sou um filho de portugueses que nasceu em África e se converteu num africano. Vivo entre o mundo católico, o mundo dessas outras religiões que não têm nome, vivo entre o ocidente e o oriente, entre esse mundo de crenças e o cientista que também sou. Então, de repente, disse para mim: “O que é que eu sou?”. Parecia que eu tinha que saber, e é um drama não saber. Às vezes, o que disse a mim próprio e gostaria de dizer aos meus filhos e amigos é que não sofram, pois, ao contrário, quando souberem, aí sim vocês terão razão para sofrer. Porque essa área do não saber, essa ignorância, é extremamente fértil, portanto convivamos bem com isso.


A entrevista completa você lê aqui.

Obrigada, Novaes/ por compartilhá-la.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

AMOR, AMOR, AMOR


 Quero dizer que te amei a vida inteira, mas você fez sangrar meu coração e agora choro todo dia. Piegas? Careta? Lugar comum? Mas foi assim mesmo que eu comecei minha cartinha para aquele que eu julgava ser meu namorado firme. Também, eu só tinha 14 anos, nem sabia o que queria dizer uma vida inteira. Era tão romântica, ou tão ingênua, ou ambos são a mesma coisa, nem sei mais.
Naquela época eu gostava de ver novela e dramatizava tudo. Uma cena que ficou gravadíssima e achei o máximo foi um tapa na cara que a Regina Duarte deu no namorado dela, quando desconfiou de uma traição, acho que aconteceu em “Carinhoso”. Queria fazer também e por isso escrevi aquela bobajada. Não deu outra, ele me ligou e marcamos um encontro no antigo Centro Comercial de Madureira - lá eu podia ir com a minha prima e meus pais nem desconfiavam.
Se eu usasse drogas, diriam que naquele dia estava chapada, pois mal o Reinaldo (nome do infeliz com quem desempenhei meus parcos dotes de atriz) despontou no corredor do shopinzinho e eu parti em sua direção como uma fera, sentando-lhe um tapa na cara. Lembro-me do seu olhar incrédulo, esbugalhado, um olhar que perguntava “essa garota enlouqueceu?” Eu saí correndo, minha prima atrás, e nunca mais vimos o Reinaldo.
Conto tudo isso porque hoje minha visão do amor é tão outra... Embora eu não saiba ainda o que é, e portanto definir é impreciso, eu sei sentir. O corpo inteiro fala comigo: olhos estranhamente congelados assistem ao mundo se esvair em vontade de ficar junto; maxilares semi-inertes não sabem mais ruminar ciúmes; estômago delicado baila na dança que o ventre ensina, digerindo o medo em enzimáticas delícias do viver; mãos e pés em febre curam minhas chagas; bambeiam pernas, misturam-se os abraços. Eu pareço que vou desabar, mas é aí que encontro minhas maiores forças. Um beijo demorado entrega a minha alma enquanto meu sangue fervilha. Ruborizo toda e sou incapaz de enganar ou disfarçar. Um tapa na cara? Nada mais longe do que é o amor para mim.
Ah, a juventude, ah o amor.